sábado, 13 de setembro de 2008

Circulando em um mundo artístico


Nem a chuva impediu que as pessoas circulassem pelas ladeiras do Complexo do Alemão no sábado, 30 de agosto. Apesar de alguns reajustes na programação e transferência de espaços para realização de algumas atividades, como as oficinas de “contação” de histórias e material reciclável, a 5ª edição do Circulando foi um sucesso. Reunindo graffiti, música, teatro, literatura e muito diálogo, o evento transformou mais uma vez a favela em um museu da cultura urbana contemporânea com jovens construindo sua arte ao vivo nos muros de casas e bares e expondo suas telas dentro de galpões.

Olhar difundido através das lentes em papel fotográfico ou pela luz do projetor. Histórias narradas e interpretadas em versos arquitetados ao som do rap. Momentos que a comunidade parou para se olhar e se apresentar ao público de fora.

Criminalizada pelo jornalismo e por grandes produções televisivas e cinematográficas, a periferia só é conhecida realmente quando apresentada pelos seus próprios moradores. Fato que é observado com muito êxito no Circulando, projeto realizado pelo Grupo Sócio Cultural Raízes em Movimento, Observatório de Favelas, com o apoio de instituições locais e da própria comunidade, que constrói habilidades técnicas nos jovens para torná-los formadores de suas imagens e produtores de novos olhares sobre sua realidade. Através desta louvável iniciativa, a favela migra das páginas criminais para as culturais, como novo espaço de socialização e circulação de arte.

Corredor cultural

Já na subida da ladeira o espectador é recepcionado por rapazes muito simpáticos convidando para “só seguir em frente”. Com a rua fechada, sem kombis subindo e descendo para estreitar o percurso, surge a possibilidade de observar atentamente cada detalhe. Nem é preciso se preocupar com o caminho, todos os moradores guiam para os pontos do evento.

Primeira parada, na sede principal do Raízes em Movimento, mais conhecida como “R1”, Tiago Tosh recepciona o público para apreciarem sua primeira exposição.
O local foi transformado em uma instalação, onde seus quadros foram cuidadosamente compostos com desenhos grafitados nas paredes, convertendo o ambiente em um universo paralelo. Objetos como uma geladeira, onde as águas do rio pintado em seu corpo seguem pelo chão, desaguando na porta de saída. Interpostos com muito verde e folhas, valorizando o meio ambiente e a ação comunitária para sua preservação, os quadros retratam uma realidade comunitária de solidariedade, com bonequinhos “multiétnicos” entrelaçados. “Uma instalação que fala da necessidade de união para resgate da fauna e da flora, além de narrar a reciclagem dos homens e de seus produtos”, diz Tosh.

Continuando a subida para o Largo, ponto principal do evento, vê-se grafites em quase todos os muros. Uma favela colorida e idealizada por seus artistas. No meio do caminho uma teia de fotografia, onde cada foto reflete momentos do cotidiano da favela, ressaltando a idéia de espírito comum, de participação comunitária e da interdependência dos seres.

Todos cooperam e querem mais

As crianças são a alma do evento. Meninos e meninas atentos e muito espertos, correndo por todos os lados ávidos por participar. Interagem com os grafiteiros e com o público, ansiosos por contos e histórias. O dono do bar principal do Largo, seu Paulo, abriu as portas da sua garagem para o Circulando, onde inicialmente seria a Oficina de Contos. Devido a uma corrente de vento que poderia resfriar as crianças, a oficina foi transferida para a segunda sede do Raízes, mas as paredes da garagem viraram telas para os grafiteiros de Nova Iguaçu, renovando-as com tanta cor e criatividade através dos desenhos. A presença do público superou as mais otimistas expectativas, para divertimento da criançada que até ajudou no deslocamento do material.

Já pela noitinha, o Grupo de Teatro Joaquim 71 animou crianças e adultos com sua performance musical. Interativos, os atores desceram do palco e colocaram as crianças em cena. Em seguida, a música continuou, mas dessa vez em batidas graves e compassadas. É o rap narrando a realidade periférica. Letra forte e chocante sobre detalhes da rotina da favela. O som segue junto com o desejo de um próximo evento.


NUCCA
Colaborou: Marcela Alice
Estudante de Josnalismo e colaboradora do evento



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